segunda-feira, 27 de agosto de 2012

O DIMINUTIVO E A ESTILÍSTICA

Um textinho sobre os "inhos" JOSÉ ROBERTO TORERO
da Equipe de Articulistas

Nossa língua é nossa pátria, e, sendo assim, algumas palavras revelam mais do nosso país do que um discurso sociológico.
Aliás, às vezes nem precisamos de uma palavra, basta um pedaço. O "inho" é um bom exemplo. Usamos esse sufixo para designar algo ou alguém pequeno, mas também algo ou alguém por quem temos carinho. Aliás, não por coincidência, a palavra carinho também acaba em "inho". Nossa bebida típica é o cafezinho, gostamos de um feijãozinho, e nossa seleção é canarinho.
Da minha infância até a adolescência, isso lá por meados dos anos setenta, era comum que os jogadores adotassem esse sufixo nos seus nomes. Lembro-me de Nelsinho, Joãozinho, Vaguinho, Adãozinho, Gatãozinho, Wilsinho e Toinzinho. Toninho então havia às pencas. Era preciso até recorrer a um complemento para que eles se diferenciassem um dos outros. Lembro-me agora de Toninho Guerrero, Toninho Metralha e até de um Toninho Vanusa.O "inho" deixa o nome ou apelido mais afetuoso, como se o jogador mantivesse ainda algumas características infantis. Não há nenhuma relação com o físico do nomeado, tanto que o Chulapa, apesar de ter quase dois metros, é chamado de Serginho. Provavelmente porque no seu jeito malandro há uma irresponsabilidade e uma alegria infantis. Por outro lado, ninguém chama Edmundo de Edmundinho. A sua irresponsabilidade não é infantil, não é simpática. Nas outras línguas, ou nações, não existe nada que se assemelhe ao "inho". Os ingleses colocam um "little" antes do nome ou um "y" depois, formando Little John ou Johnny, mas não é a mesma coisa. Os franceses podem recorrer ao composto Petit Jean, mas há um tanto de pompa nessa fórmula. Já os espanhóis tentam o Juanito, mas aquele áspero "t" quebra a doçura do apelido.
Joãozinho é um nome intraduzível. Tanto quanto a bandeira nacional, o hino brasileiro, a feijoada, o samba ou o drible, o "inho" é uma marca da brasilidade. Nenhuma outra seleção do mundo, nem mesmo a portuguesa, tem hoje um jogador com esse sufixo. Aliás, não tem e nem poderia ter: o "inho" carrega um quê de humor e de brejeirice que não combina com a severidade e com os bigodes lusitanos. Nossos "inhos" são inesquecíveis, a começar por Zizinho, o maior jogador da primeira metade do século. Mas há também Julinho, do Palmeiras; Coutinho, do Santos; Jairzinho, do Botafogo; Edinho, do Fluminense; Nelinho, do Cruzeiro; Toninho Cerezo, do Atlético-MG; Serginho, do São Paulo, e assim por diante. Ainda hoje o "inho" daria uma bela seleção. Pense em Edinho (Santos), Jorginho (São Paulo), Marinho (Guarani), Carlinhos (Lusa) e Serginho (Milan); Ricardinho (Cruzeiro), Juninho (Vasco) e Marcelinho (Corinthians); Ronaldinho (Grêmio), Ronaldinho (Internazionale) e Zinho (Palmeiras). Como técnico, escolha entre Carlinhos, Cabralzinho ou Candinho. Um time de nomes no diminutivo, mas que jogaria um futebol superlativo.
Mas creio que o destino do "inho" é a extinção. Dirigentes e empresários não gostam que seus contratados tenham nomes no diminutivo, e assim, para dar uma impressão de maior profissionalismo, vão surgindo os Alex Alves, os Marcus Assunção e os Fernando Diniz. Saem os "inhos", entram os sobrenomes. Como diria Cartola, "a vida é um moinho".
Moinho que, só por coincidência, também termina em "inho".

http://www1.folha.uol.com.br/fsp/opiniao/27841-penultima-flor-do-lacio.shtml

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