domingo, 4 de novembro de 2012

A ausência das "letras" F, L e R na linguagem dos tupinambás


Em que se declara o modo e a linguagem dos tupinambás.

 

Ainda que os tupinambás se dividiram em bandos, e se inimizaram uns com outros, todos falam uma língua que é quase geral pela costa do Brasil, e todos têm uns costumes em seu modo de viver e gentilidades; os quais não adoram nenhuma coisa, nem têm nenhum conhecimento da verdade, nem sabem mais que há morrer e viver; e qualquer coisa que lhes digam, se lhes mete na cabeça, e são mais bárbaros que quantas criaturas Deus criou. Têm muita graça quando falam, mormente as mulheres; são mui compendiosas na forma da linguagem, e muito copiosos no seu orar; mas faltam-lhes três letras das do ABC, que são F, L, R grande ou dobrado, coisa muito para se notar; porque, se não têm F, é porque não têm fé em nenhuma coisa que adorem; nem os nascidos entre os cristãos e doutrinados pelos padres da Companhia têm fé em Deus Nosso Senhor, nem têm verdade, nem lealdade a nenhuma pessoa que lhes faça bem. E se não têm L na sua pronunciação, é porque não têm lei alguma que guardar, nem preceitos para se governarem; e cada um faz lei a seu modo, e ao som da sua vontade; sem haver entre eles leis com que se governem, nem têm leis uns com os outros. E se não têm esta letra R na sua

pronunciação, é porque não têm rei que os reja, e a quem obedeçam, nem obedecem a ninguém, nem ao pai o filho, nem o filho ao pai, e cada um vive ao som da sua vontade; para dizerem Francisco dizem Pancico, para dizerem Lourenço dizem Rorenço, para dizerem Rodrigo dizem Rodigo; e por este modo pronunciam todos os vocábulos em que entram essas três letras.

 

(SOUSA, Gabriel Soares de. Tratado descritivo do Brasil em 1587- Capítulo CL – Em que se declara o modo e a linguagem dos tupinambás. In: VILLA, Marco Antonio e OLIVIERI, Antonio Carlos. Cronistas do Descobrimento. São Paulo: Ática, 1999, p. 144).
 
 
 

Num País Feliz

Belchior

Ainda não se ouvia o ai do sabiá
E nem Jaci sabia que ele assobiava lá
O índio ia indo, inocente e nu
E no cauim ninguém sentia a essência do caju
Não navegavam naus abaixo do equador
Aqui sem sonhos maus, não há anhanguá,
nem cruz nem dor
E o índio ia indo, inocente e nu
Sem rei, sem lei, sem mais, ao som do sol
e do uirapuru
Não navegavam naus abaixo do equador
E à terra chã, tupã descia sem pam de tambor
Ainda não se ouvia o dó das juritis
E eu já sonhava com a cor e o tom de algum paí
Num país feliz
 

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