PODER DA ETIMOLOGIA
Quando o professor Nemésio explicou a Cacilda que
o nome dela, segundo Zambaldi, quer dizer “a que
combate com lança”, a moça ficou triste. É tão doce
esse nome (experimentem pronunciá-lo) e tão meiga
a sua portadora, que a revelação lhe pareceu a mais
injusta possível.
O pior é que os irmãos começaram a brincar com ela
de maneira provocadora, dizendo a cada instante:
“Cacilda, onde você escondeu sua lança?” Ou: “O
amolador de facas está na esquina da rua Júlio de
Castilhos. Leve a lança para ele afiar, Cacilda.”
De aveludada que era, Cacilda tornou-se suscetível e
mesmo agressiva. O namorado rompeu com ela,
dizendo que tinha medo de uma lanceira polonesa. E
Cacilda quedou, fera e tristinha, em seu quarto onde
havia gravuras de guerras napoleônicas.
A família procurou o professor Nemésio que,
benevolamente, se dispôs a pacificar a moça: “Minha
filha, isso de etimologia é muito discutível, cada um
diz uma coisa, e esse tal de Zambaldi já foi
desacreditado por pesquisas recentes. O verdadeiro
significado do nome de uma pessoa é o que lhe confere
a pessoa que o tem. Você é tão encantadora que seu
nome só pode significar você mesma, isto é, encantos
mil.”
Cacilda acreditou e voltou ao estado gentil, mas
sucede que, de vez em quando...
ANDRADE, Carlos Drummond de. Prosa seleta. Rio de Janeiro:
Nova Aguilar, 2003.
Nenhum comentário:
Postar um comentário