terça-feira, 2 de abril de 2013

 

PODER DA ETIMOLOGIA

Quando o professor Nemésio explicou a Cacilda que

o nome dela, segundo Zambaldi, quer dizer “a que

combate com lança”, a moça ficou triste. É tão doce

esse nome (experimentem pronunciá-lo) e tão meiga

a sua portadora, que a revelação lhe pareceu a mais

injusta possível.

O pior é que os irmãos começaram a brincar com ela

de maneira provocadora, dizendo a cada instante:

“Cacilda, onde você escondeu sua lança?” Ou: “O

amolador de facas está na esquina da rua Júlio de

Castilhos. Leve a lança para ele afiar, Cacilda.”

De aveludada que era, Cacilda tornou-se suscetível e

mesmo agressiva. O namorado rompeu com ela,

dizendo que tinha medo de uma lanceira polonesa. E

Cacilda quedou, fera e tristinha, em seu quarto onde

havia gravuras de guerras napoleônicas.

A família procurou o professor Nemésio que,

benevolamente, se dispôs a pacificar a moça: “Minha

filha, isso de etimologia é muito discutível, cada um

diz uma coisa, e esse tal de Zambaldi já foi

desacreditado por pesquisas recentes. O verdadeiro

significado do nome de uma pessoa é o que lhe confere

a pessoa que o tem. Você é tão encantadora que seu

nome só pode significar você mesma, isto é, encantos

mil.”

Cacilda acreditou e voltou ao estado gentil, mas

sucede que, de vez em quando...

ANDRADE, Carlos Drummond de. Prosa seleta. Rio de Janeiro:



Nova Aguilar, 2003.

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